“Nesses sessenta anos da ditadura, estou me sentido como um rei. Eu sou pobre, estou aqui dentro de casa, mas estou me sentido um rei. Porque valeu a pena tudo, valeu a pena lutar tudo. Todo o sofrimento que a gente passou, enfrentar as prisões e as mortes de nossos queridos camaradas, a guerrilha do Araguaia, o Marighella, o Carlos Lamarca, valeu a pena. Esses caras entregaram a sua vida pelo país, pelo povo, pela humanidade. Valeu a pena tudo. Valeu a pena absolutamente tudo. E, se tiver de fazer de novo, a gente faz.” Palavras do dirigente sindical Ubiraci Dantas de Oliveira, falando ao TUTAMÉIA sobre a resistência e as lutas do movimento dos trabalhadores contra a ditadura. Bira, como ele é conhecido, tinha onze anos no dia do golpe militar. “Meu pai falou prá mim: vem prá dentro, que a coisa está feia aí”, lembra ele nessa entrevista realizada em dez de fevereiro de 2024. “Quando o teve o golpe, eu fui prá dentro de casa. Fui chamado pelo meu pai. E as pessoas tristes. Eu não posso dizer outra coisa, porque eu era muito novo, e não tinha aprendido ainda o que era lutar pela democracia.” O aprendizado começou em casa mesmo: “Meu pai era um democrata, não tinha vinculação, mas meu tio Severino era do Partido Comunista Brasileiro. Ele trabalhava com técnico eletrônico na Phillips. Ele me ajudou muito, junto com meu pai, mostrando o que estava acontecendo no país e no mundo também’. Por incentivo do pai, Josué Dantas de Oliveira, o jovem Ubiraci foi estudar no Senai, no Brás. “Aprendi uma profissão, aprendi a jogar basquete, dama, futebol, xadrez, aprendi tudo lá no Senai. Lá era assim: seis meses no Senai e depois seis meses na fábrica que eles indicavam. E ali, meu amigo, foi onde eu aprendi a viver. Muita exploração, muita situação difícil.” Operário metalúrgico, conheceu grupos de resistência à ditadura militar, entrou para o Movimento Revolucionário Oito de Outubro. Em 1978, participou do comando de uma greve na Philco, onde trabalhava. Eis seu relato: “No dia da greve, a gente marcou uma assembleia no restaurante da firma. Foi legal, juntou lá o pessoal. Eu subi numa mesa e comecei a falar. Aí um segurança puxou um revólver. Eu falei com ele: ‘O meu, para com isso, sai daqui, se não vai dar problema’. Aí o povo começou a vaiar ele, e ele saiu em desabalada carreira. Foi embora. A gente conseguiu fazer a greve.” O movimento durou cinco dias. Em quatro de outubro, no meio do movimento, a repressão baixou firme: “A polícia me prendeu na porta da Philco. Me mandaram para a prisão, fiquei lá no Dops. Na hora em que foi ter o interrogatório, chegou lá o delegado, todo apavorado, e falou: ‘Você está livre, pode ir’”. “Quando cheguei na porta, estava lá o carro do sindicato para me levar. Quando eu chego lá, no sindicato, a comissão de fábrica toda estava lá e mais uma porrada de trabalhadores exigindo a minha libertação, lá na sede do sindicato. Aí eu compreendi que alguém fez as articulações, e eu fiquei livre. Se não, eu não estaria aqui para contar essa história.” Hoje vice-presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil e membro do Comitê Central e da Comissão Política do Partido Comunista do Brasil, Oliveira fala sobre a situação do país: “O sustentáculo da democracia é o bem estar do povo. Se o povo não estiver bem, se estiver desesperado, é uma beleza para os fascistas retomarem. Eu considero que o governo Lula está numa direção positiva. Fez uma série de coisas nesse ano e meio e lançou agora o plano da nova indústria. Está na direção correta. No entanto, tem outros obstáculos para serem ultrapassados, como a taxa de juros.” E continua: “Nós temos de ajudar o Lula a romper com isso, para poder ter recursos para a educação, para a saúde, para a indústria nacional, para o complexo industrial da saúde. É preciso jogar pesado nessa direção, porque é o seguinte: não adianta dourar a pílula. Se o povo está sentido firmeza, ele vai para a frente. Mas, se sentir enrolação, ele vai procurar um outro caminho. E aí, geralmente, são caminhos que podem trazer para nós muito desespero.” O depoimento integra uma série de entrevistas sobre o golpe militar de 1964, que está completando sessenta anos. Com o mote “O que eu vi no dia do golpe”, TUTAMÉIA publica neste mês de março mais de duas dezenas de vídeos com personagens que vivenciaram aquele momento, como Almino Affonso, João Vicente Goulart, Anita Prestes, Frei Betto, Roberto Requião, Djalma Bom, Luiz Felipe de Alencastro, Ladislau Dowbor, José Genoíno, Roberto Amaral, Guilherme Estrella, Sérgio Ferro e Rose Nogueira. Inscreva-se no TUTAMÉIA TV e visite o site TUTAMÉIA, , serviço jornalístico criado por Eleonora de Lucena e Rodolfo Lucena. Acesse este link para entrar no grupo AMIG@S DO TUTAMÉIA, exclusivo para divulgação e distribuição de nossa produção jornalística:
Hide player controls
Hide resume playing